21 dezembro 2004

Iraque - Eleições são uma farsa

resistentes iraquianos armados são já mais de 40.000

A realização de eleições no Iraque, a 30 de Janeiro, é contestada por 65 partidos políticos e movimentos iraquianos que apelam ao boicote do escrutínio sob ocupação.

«É um daqueles momentos da história em que muita gente se espantará por ver uma sociedade passar tão depressa de uma sociedade de tirania e de tortura para uma sociedade onde as pessoas se podem exprimir através de eleições», afirmou a 2 de Dezembro o presidente norte-americano, George W. Bush, ao manifestar a sua oposição ao adiamento das eleições iraquianas (The Los Angeles Times, 3 de Dezembro de 04).
As palavras de Bush não passam de mais um embuste que a dramática realidade iraquiana se encarrega de demonstrar.
A pouco mais de um mês do escrutínio, dados divulgados pela Medact a 30 de Novembro, em Londres, perante a Associação de Imprensa Estrangeira, revelam que:
- o perigo de morrer de forma violenta no Iraque é actualmente 58 vezes maior do que antes da invasão norte-americana;
- doenças como a cólera e a febre tifóide reapareceram em força no país;
- 25 por cento das crianças sofrem de subnutrição, inexistente no Iraque antes das guerras e do embargo decretado em 1991.
No final de Outubro, um outro relatório, divulgado pelo jornal científico The Lancet - «Mortality before and after the 2003 Invasion of Iraq: Cluster Sample Survey», The Lancet, 29 October 2004 - dava conta de que pelo menos 100 000 pessoas foram mortas após a invasão do Iraque pelos EUA, e que 84 por cento dessas mortes são directamente imputáveis à acção das tropas norte-americanas e britânicas. O estudo revela ainda que 95 por cento das vítimas foram mortas por ataques aéreos e tiros de artilharia, que atingiram sobretudo mulheres e crianças.

Dividir para reinar

Se ao panorama descrito se acrescentar o facto de o assalto a Fallujah para «degolar alguns terroristas», segundo a versão dos EUA, ter provocado mais de 200 000 refugiados (de um total de 300 000 habitantes), que segundo a ONU se encontram numa situação desesperada; e se se tiver em conta que grande parte da população iraquiana vive praticamente sem água, com cortes constantes de electricidade, sem segurança, sem trabalho (mais de 70 por cento está desempregada), torna-se por demais evidente que nem com muito boa vontade se pode falar de eleições democráticas.
Acresce que o registo dos eleitores foi feito com base nas senhas de racionamento de alimentação existentes durante o embargo de 1991 a 2003, que estão longe de se poder considerar fiáveis. Para tornar o cenário ainda mais complexo, de referir que os eleitores vão ter de escolher entre 212 partidos registados, 30 dos quais têm no nome a palavra «patriótico», 24 a palavra «democrático», 21 a palavra «islâmico». A par destes há ainda dezenas de partidos tribais e religiosos.
Face a esta situação, tudo leva a crer que os EUA estão apostados num Iraque dividido em facções, teoricamente mais fácil de dominar, em que o poder central não terá acesso às riquezas petrolíferas.
É contra semelhante estratégica que a resistência iraquiana se bate, defendendo um programa de unidade nacional e rejeitando eleições sob ocupação. O aumento de acções para 150 por dia (dez vezes mais do que há um ano) e o apelo ao boicote das eleições mostra que o ocupante não terá a tarefa facilitada. Confirmando as dificuldades, o Pentágono chamou a semana passada mais 12 000 soldados para reforçar o contigente no Iraque.

O preço da ocupação

Segundo dados publicados no Asia Times («The costs of the failed Iraqi transition», 2 Outubro 2004):
- a média dos mortos e feridos americanos é de 747 por mês desde o fim de Junho, contra 415 durante os primeiros 15 meses de ocupação;
- o número dos resistentes armados passou, segundo o general-major britânico Andrew Graham, de 5000 em Novembro de 2003 para 40 a 50 000 em Setembro de 2004.
- a margem de manobra dos EUA junto das potências ocidentais reduz-se: a França anunciou que apoiará uma conferência sobre o Iraque desde que nela participe a resistência, em pé de igualdade com os partidos representados no governo. Os EUA estão contra. A 5 de Novembro, o presidente francês, Jacques Chirac, abandonou a cimeira europeia no momento em que o primeiro-ministro iraquiano, Allawi, entrou na sala.

fonte: jornal avante!

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